MEDITAÇÃO DE RELAXAMENTO
Nesta meditação a proposta é relaxar, relaxar a todos os níveis. Saber relaxar é muito importante pois uma mente “stressada” perde todas as suas faculdades, como a capacidade de se concentrar, de pensar, de lembrar, etc. Esta meditação consiste em três passos:
1º Relaxamento do corpo
Escolhida a posição de meditação, mentalmente observamos todo o nosso corpo e relaxamos, parte por parte, da cabeça aos pés. Aprendemos a imobilizar o corpo, sem esforço nem tensão. Quando o corpo está completamente relaxado torna-se ausente, deixamos de o sentir, tal como acontece quando dormimos, e experimentamos uma sensação de leveza.
2º Relaxamento da respiração
Com o corpo estável e relaxado passamos a observar a respiração (prāṇa vikṣanam). Apenas observamos o ar entrando e saindo pelas narinas, sem interferir. Isto torna a respiração bem suave, lenta e relaxada.
3º Relaxamento da mente
Agora, o relaxamento da mente. Para relaxar a mente podemos:
a) Visualizar a natureza (um rio, árvores, montanhas, campo, praia, etc.), pois tudo na natureza é relaxado. O único local do mundo onde existe tensão é na mente humana J.
b) Auto-sugestão. Usar palavras ou pequenas frases que induzam relaxamento. Repetir mentalmente para nós mesmos: “eu estou relaxado, eu estou em paz, eu estou tranquilo, eu estou bem”.
c) Pensar em Īśvara e como tudo está em harmonia no universo. Quando confiamos no Todo, relaxamos. Desenvolvemos paciência para saber esperar, não ansiar pelo que está para vir. Estamos prontos para esperar e preparados para aceitar e enfrentar o que venha no futuro, agradável ou desagradável, como um presente de Īśvara.
d) Observar os pensamentos que surgem na mente, sem analisar e sem julgar. Apenas testemunhamos os pensamentos, sem alimentá-los, sem cooperarmos com a mente.
A meditação de relaxamento pode ser praticada como uma meditação independente, mas é também a preparação para todos os outros tipos de meditação.
MEDITAÇÃO DE CONCENTRAÇÃO
A proposta desta meditação é focar, concentrar a mente. Dar uma ocupação à mente para esta se concentrar durante um determinado período de tempo, sem distrações.
Tradicionalmente existem três tipos de exercícios para concentrar a mente:
Mānasa pūjā
Ritual de oferenda mental (mānasa significa mental), à deidade pessoal e/ou ao guru (no caso de os termos), que representam o Absoluto. Em mānasa pūjā o campo de concentração é vasto, uma vez que temos de mentalizar várias ações relacionadas com o ritual de oferenda. Se não conhecemos os passos tradicionais da pūjā, podemos simplesmente pensar no Todo ou no nosso guru e mentalmente oferecer-lhe flores, ou fazer namaskāra (prostração) a seus pés.
Mānasa parāyanam
É a recitação mental de um stotram ou de dhyāna ślokas. São poemas de louvor aos diferentes aspetos do Todo (Śiva, Ganeśa, Devī, etc.), como o Dakṣiṇāmūrti Stotram, ao guru, como o Guru Stotram, ou às escrituras, como os Gītā Dhyānam ślokas. Em parāyanam o campo de concentração é mais reduzido (relativamente a mānasa pūjā), uma vez que nos concentramos apenas nas palavras que vamos recitando mentalmente.
Quando fazemos mānasa parāyanam não pensamos no significado do que estamos a recitar. Podemos fazê-lo antes de começar o exercício mas, uma vez iniciado, concentramo-nos apenas nas palavras. O significado pode até surgir na nossa mente e permanecer como pano de fundo mas, deliberadamente, concentramo-nos somente nas palavras.
Mānasa japa
Japa é uma forma de oração e também uma atividade mental que nos permite reconhecer os padrões de pensamentos, ajudando-nos a concentrar e a tranquilizar a mente.
No japa repetimos sucessivamente um mesmo mantra, que pode ser apenas uma palavra como “Rām”, uma curta frase como o “Oṁ iśaya namaḥ” ou um pequeno conjunto de frases como o Gāyatrī mantra.
Existem três formas de fazer japa:
1) Ucca japa – o mantra é cantado de forma audível.
2) Manda japa – o mantra é cantado mas não é audível para os demais.
3) Mānasa japa – o mantra é feito mentalmente.
Das três formas de japa só a última pode ser considerada, verdadeiramente, meditação. Lembremo-nos da definição de upāsanam: “saguṇa brahma viṣaya mānasa vyāpāraḥ”. O mānasa japa é a forma mais difícil de fazer japa, pois requer um grande esforço para manter a mente concentrada no mantra. Por essa razão, é a forma de japa com um resultado mais profundo e transformador no praticante. Nos primeiros tempos, caso sintamos dificuldade no japa mental, podemos utilizar as restantes formas de japa para habituarmos a mente a esta prática e mais tarde fazer a transição para o mānasa japa.
Sendo o japa uma forma de meditação, a palavra ou a curta frase que escolhemos repetir deve, uma vez mais, remeter-nos para o Todo, para Īśvara. Como um mero exercício de concentração poderíamos escolher um som sem significado como “xrim” ou uma palavra com significado como “banana”. Mas isto traria alguns problemas à nossa meditação.
No caso de repetirmos um som sem significado, cedo ou tarde iríamos perguntar-nos o porquê de estarmos a fazer isso. É muito difícil estarmos sentados, de olhos fechados e de forma séria a repetir um som sem significado.
Poderíamos optar por repetir uma palavra com significado, uma palavra comum como “banana”. Mas, apesar de ter um significado, a banana é um nome para um objeto particular. Ela não abrange toda a criação. Quando pensamos em banana pensamos num objeto particular e não no Todo. Este tipo de palavras, associado a objetos particulares, não tem a capacidade de invocar a pessoa essencial que somos, livre de papéis.
Ao escolhermos uma palavra associada a Īśvara, essa palavra inclui tudo sem indicar um objeto em particular. Uma vez que Īśvara é todas as formas, nada é omitido quando repetimos um dos nomes de Īśvara. Desta forma, invocamos a nossa relação com Īśvara. Esta relação básica, indivíduo-Todo, é a relação mais importante que devemos desenvolver e nutrir (como já vimos anteriormente). Todas as outras relações são temporárias, carregam um papel relativo e implicam certas limitações e conflitos. A relação com o Todo é a relação fundamental, sempre permanente, tal como a relação da onda com a água. E esta relação não acarreta os conflitos e as limitações das outras relações. Quando fazemos japa, invocamos a nossa relação com o Todo e desfrutamos de uma mente mais tranquila, pois as distrações conectadas com os papéis que representamos no dia-a-dia perdem força.
Em relação ao exercício em si, é importante referir que não se deve associar a repetição do mantra à respiração, pois a meditação é somente uma atividade mental. Se tal acontecer e se tivermos dificuldade em dissociar a repetição do mantra da respiração, podemos experimentar, por momentos, acelerar bastante a repetição do mantra, mantendo a respiração tranquila. Feita a dissociação, deixamos a respiração à vontade e voltamos a concentrar-nos apenas no mantra.
No japa, o campo de concentração é ainda mais reduzido do que em parāyanam, pois concentramo-nos apenas numa palavra ou numa pequena frase, repetindo-a várias vezes. Dos três tipos de concentração o japa é a técnica mais eficaz para concentrar a mente. Na realidade, o japa desempenha um papel muito importante no sādhana (prática espiritual) ao proporcionar-nos dois grandes benefícios:
1 – CONCENTRAÇÃO DA MENTE
Nenhum ser humano consegue prever qual será o seu próximo pensamento. Os pensamentos surgem na mente e vão-se conectando uns com os outros, criando uma corrente de pensamentos que segue uma lógica própria da mente. Esta tem a capacidade de mover-se rapidamente de um pensamento para outro e, em poucos segundos, fazer diversas associações entre os pensamentos.
Para ganharmos um controlo sobre a mente, para percebermos como funciona e conseguirmos focá-la num único assunto devemos recorrer ao japa. Como no japa só existe um pensamento (um pensamento que foi escolhido por nós – o mantra), ao repetirmos o mesmo mantra, se algum outro pensamento surge, sabemos que isso não era o esperado, uma vez que decidimos concentrar a mente num único pensamento. Assim, apercebendo-nos da distração da mente, podemos trazê-la de novo para o mantra. Este trazer a mente de volta ao objeto de concentração é a meditação.
Neste processo, aprendemos a recusar pensamentos indesejáveis e a reter a atenção no pensamento que escolhemos.
É normal ocorrerem distrações enquanto meditamos. Não devemos pensar que vamos fazer japa e as distrações não vão aparecer. O nosso compromisso não está em não termos distrações. O nosso compromisso está, durante o japa, em trazer a mente de volta sempre que a distração ocorrer.
2 – PERCEBER O ESPAÇO DE SILÊNCIO ENTRE DOIS PENSAMENTOS
Uma vez que repetimos sempre o mesmo mantra, ou seja, um único pensamento, cada repetição mental é uma unidade completa em si mesma. Uma unidade pensamento não está conectada com a segunda unidade pensamento uma vez que ambas são o mesmo. E assim, o intervalo entre uma repetição e outra torna-se disponível para o nosso reconhecimento. Este intervalo, que está sempre presente entre os pensamentos mas que normalmente não o percebemos no dia-a-dia, é silêncio.
Este silêncio está sempre presente: antes do pensamento, depois do pensamento e durante a presença do pensamento, tal como eu, Consciência, estou sempre presente. O silêncio é a base de onde os pensamentos brotam.
O entendimento claro de que, por um lado, eu estou sempre presente, independentemente da presença ou ausência dos pensamentos e por outro, eu sou aquele que observa e não o que é observado (por exemplo os pensamentos), chega-nos através do escutar do ensinamento de Vedānta e não através do japa. Mas o japa cria uma excelente oportunidade para reconhecermos isto mesmo. Neste contexto, o japa torna-se numa prática de nididhyāsanam.
Como ensina o Svāmi Dayānanda: “Existe um espaço entre o papel e a pessoa. Mas não é espacial. Desempenhar um papel sem perder a consciência de si mesmo é possível através de um sādhana [prática espiritual], suportado pelo conhecimento [ātma jñāna]. Japa é o sādhana.”